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Estratégias para aumentar a penetração de fármacos ou cosméticos

No nosso último artigo, conversamos sobre essa maravilhosa barreira de tijolos e cimento que é a camada córnea da pele humana. Nesse artigo, vamos conversar sobre algumas metodologias que irão promover uma penetração de fármacos de forma eficiente através da camada córnea. Devemos levar em conta a natureza e concentração dos princípios ativos, os excipientes e o sistema utilizado para transporte desse fármaco ou cosmético.

Podemos considerar duas grandes classes de métodos para aumentar essa penetração: os métodos passivos e os métodos ativos. Os métodos passivos trabalham no sentido de melhorar a formulação, enquanto os ativos atuam através de tecnologias que usam de uma força externa para atuar sobre a pele ou o fármaco. Nesse artigo nos focaremos nos métodos passivos, e no próximo artigo nos métodos ativos.

 

Métodos passivos: melhorar a formulação para absorção transdérmica

Promotores químicos:

estratégia de transporte transdérmico atualmente mais utilizada, são substâncias que melhoram o transporte dos princípios ativos através da redução temporária e reversível das propriedades de barreira da camada córnea.

Na tabela abaixo vemos alguns tipos de promotores químicos e seu mecanismo de facilitação da penetração transdérmica. Idealmente, um bom promotor químico deve ser farmacologicamente inerte, atóxico, não irritante e não alergênico, barato, facilmente incorporável à formulação, bem como permitir que as propriedades de barreira da pele sejam rápida e completamente reestabelecidas, assim que eles forem removidos da pele.

O maior desafio que encontramos na sua utilização é a irritação da pele. Quanto mais profundamente o promotor químico atuar na desorganização da pele, penetrando através da camada córnea e chegando à epiderme viável, interagindo com os queratinócitos (células vivas da epiderme), maior é a possibilidade de gerar inflamação local, eritema, edema ou dermatite. Uma boa estratégia é combinar promotores químicos para não só melhorar sua potência, como também aproveitar seus efeitos sinérgicos pela complementariedade de seus mecanismos de ação.

 

Promotor químicoExemplosMecanismoAção
ÁguaAumento na hidratação da camada córneaAumento do fluxo transdérmico
Álcooisetanol, pentanol, álcool benzílico, álcool láurico, propilenoglicol, glicerolExtração de lipídeos ou proteínasEntumescimento da camada córnea, melhora na partição do fármaco, melhora na solubilidade da formulação
Ácidos graxosÁcido oleico, ácido linoleico, ácido valérico e ácido láuricoPartição entre as camadas lipídicasDesorganização da camada lipídica, melhoria da partição do fármaco na camada córnea, formação de complexo lipídico com o fármaco
AminasDietanolamina, trietanolaminaPartição entre as camadas lipídicasMelhoria da partição do fármaco na camada córnea
AmidasAzona, dimetilacetamida, pirrolidona, ureiaPartição entre as camadas lipídicasDesorganização da camada lipídica, melhoria da partição do fármaco na camada córnea
ÉsteresMiristato de isopropilaPartição entre as camadas lipídicasDesorganização da camada lipídica, melhoria da partição do fármaco na camada córnea
HidrocarbonetosAlcanos, esqualenoPartição entre as camadas lipídicasDesorganização da camada lipídica, melhoria da partição do fármaco na camada córnea
TensoativosLaureato de sódio, geminiQuebra da tensão superficialAtividade depende do equilíbrio hidrofílico/ lipofílico, carga e comprimento da cauda lipídica
Terpenos, Terpenóides e óleos essenciaisAção depende  das características físico-químicas de cada um e principalmente de sua lipofilia.
SulfóxidosDimetilsulfóxidoSolventeMelhoria da partição do fármaco na camada córnea
FosfolipídeosEstruturas micelares ou vesicularesFundição com as camadas lipídicas da camada córneaDesorganização da camada córnea, melhoria da partição do fármaco na camada córnea
CiclodextrinasFormação de complexos de inclusão com fármacos hidrofóbicosAumento do coeficiente de partição dos fármacos hidrofóbicos e sua solubilidade na camada córnea

 

Supersaturação:

estratégia de aumentar-se a quantidade de princípio ativo dissolvido até o ponto de exceder a sua solubilidade no veículo. O fluxo do fármaco dessa forma aumenta devido ao aumento da sua atividade termodinâmica. A desvantagem desse método é que a supersaturação promove a recristalização do fármaco, gerando a necessidade da adição de compostos que previnam esse fenômeno, como o PVP (polivinilpirrolidona).

Pró-fármacos:

adição de grupos que possam alterar a capacidade de permeação transdérmica de fármacos, a estabilidade química e enzimática, além de diminuir seu potencial de irritação da pele. Esses grupos são principalmente aqueles que sofrem clivagem, como ésteres ou carbonatos, de forma que possam aumentar a lipofilicidade do fármaco e facilitem sua permeação. A principal limitação dessa estratégia é o aumento da dimensão das moléculas, aumentando seu peso molecular e dificultando sua permeação.

Transportadores coloidais:

incorporando vesículas coloidais transportadoras às formulações é possível aumentar a permeação transdérmica e ainda a solubilização do fármaco na formulação e a sua partição para a pele, devido à organização supramolecular desse tipo de estruturas. Existem diferentes estruturas disponíveis e conhecidas hoje, indo desde as emulsões clássicas preparadas a partir de lipídeos e tensoativos, passando por microemulsões, nanoestruturas, nanopartículas lipídicas, nanopartículas poliméricas e chegando até nanopartículas magnéticas. Na tabela abaixo você encontra mais informações sobre essas estruturas.

 

EstruturasComposiçãoAção
LipossomasLipídeos e tensoativos (Fosfolipídeos dispostos em bicamadas concêntricas)Limitada à camada córnea
NiossomasLipídeos e tensoativos não iônicosLimitada à camada córnea
TransferosomasLipídeos, colesterol e tensoativosAlta elasticidade e flexibilidade, penetração através de um gradiente de hidratação entre as camadas da camada córnea e da epiderme viável
EtossomasLipídeos, etanol e tensoativosFluidifica os lipídeos dos fármacos e das bicamadas lipídicas da camada córnea, permitindo a penetração destas vesículas deformáveis
MentossomasFosfolipídeos, tensoativo e mentolTransportadores deformáveis
MicroemulsõesÁgua, óleo, tensoativo e co-tensoativoSolubilizar fármacos hidrofílicos em meio lipofílico, lipofílico em meio aquoso e anfifílicos na interface óleo/ água, além de atuarem como promotores de permeação cutânea de diversos fármacos, devido ao tamanho reduzido das gotículas formadas e seu elevado teor de lipídios, que desorganiza os lipídios da pele.
Nanopartículas lipídicas sólidasLipídios sólidos como triglicerídeos purificados, mistura de glicerídeos ou ceras, com a superfície coberta por um tensoativo que estabiliza a dispersãoEfeitos de aderência, oclusão e hidratação da pele. Suas propriedades adesivas levam à formação de uma monocamada hidrofóbica na pele, produzindo um efeito oclusivo e consequentemente a redução da organização dos corneócitos e ao aumento do espaço inter-corneocitário, com consequente penetração do fármaco para as camadas mais profundas.
Transportadores lipídicos nanoestruturadosMistura de lipídios sólidos e líquidos
Conjugados fármaco-lipídicosPreparados a partir da formação de um sal ou por ligação covalente, seguida de homogeneização, aplicando-se fármacos hidrofílicos
Nanopartículas poliméricasPreparadas a partir de polímeros naturais (quitosano, albumina, gelatina) ou sintéticos (poliacrilamida, poliacrilato). Podem ser imobilizados na superfície (reação de polimerização) ou encapsulados na estrutura (durante a fase de polimerização)Capazes apenas de penetrar camadas superficiais da camada córnea, a partir das quais o fármaco encapsulado será liberado para as camadas mais profundas da pele, podendo também penetrar nos folículos pilosos.
Nanopartículas magnéticasProduzidas a partir de metais (cobre, ferro, cobalto, manganês)Podem penetrar a camada córnea e atingir a camada granulosa

 

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Fonte: Revista de Ciências Farmacêuticas Básica e Aplicada., 2015; 36(3); 337-348 ISSN 1808-4532; “Permeação cutânea: desafio e oportunidades”.
Permeação Cutânea